DIREITO IMOBILIÁRIO


Contratos imobiliários. Negócios imobiliários. Cláusulas contratuais com eficácia erga omnes. Compra e venda e cláusula de vigência do contrato de locação em caso de alienação do imóvel.  Requisitos para validade. Necessidade de averbação perante o Registro de Imóveis.


Olá pessoal! 
              Em recente julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, e seguindo o voto do Relator, deu provimento ao recurso da adquirente de um famoso shopping center do Rio de Janeiro,  no sentido de que esta não está obrigada a respeitar o contrato de locação firmado entre a vendedora e a locatária de uma das lojas do shopping, haja vista, que segundo o entendimento adotado na espécie, a simples menção de que a adquirente se sub-rogava nos direitos e obrigações do vendedor/locador, quanto aos diversos contratos de locação que este mantinha com os lojistas, não foi considerada bastante de forma a obrigar o novo proprietário a manter  a locação. Eis os termos da ementa:
“EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AQUISIÇÃO. SHOPPING CENTER. LOJAS. LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO. CLÁUSULA DE VIGÊNCIA. REGISTRO. AUSÊNCIA. OPOSIÇÃO. ADQUIRENTE. IMPOSSIBILIDADE.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. A controvérsia gira em torno de definir se o contrato de locação com cláusula de vigência em caso de alienação precisa estar averbado na matrícula do imóvel para ter validade ou se é suficiente o conhecimento do adquirente acerca da cláusula para proteger o locatário.
3. A lei de locações exige, para que a alienação do imóvel não interrompa a locação, que o contrato seja por prazo determinado, haja cláusula de vigência e que o ajuste esteja averbado na matrícula do imóvel.
4. Na hipótese dos autos, não há como opor a cláusula de vigência à adquirente do shopping center. Apesar de no contrato de compra e venda haver cláusula dispondo que a adquirente se sub-rogaria nas obrigações do locador nos inúmeros contratos de locação, não há referência à existência de cláusula de vigência, muito mesmo ao fato de que o comprador respeitaria a locação até o termo final.
5. Ausente o registro, não é possível impor restrição ao direito de propriedade, afastando disposição expressa de lei, quando o adquirente não se obrigou a respeitar a cláusula de vigência da locação.
6. Recurso especial provido.”
(REsp 1.669.612 / RJ. Relator: MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA.).
               Interessante destacar a lição Silvio de Salvo Venosa, constante do voto do voto do eminente Ministro Relator RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, ipsis litteris:
 "(...) Quando o legislador resolve proteger certas relações oriundas de contratos da interferência de terceiros, confere à obrigação uma eficácia real que é alcançada pelo registro (sempre o imobiliário e não o de títulos e documentos). Nessa hipótese, assim como naquela do art. 31, registrado o contrato, terceiros que venham a adquirir o imóvel devem respeitar a obrigação, durante o decurso de prazo (...). De qualquer modo, o registro confere uma eficácia limitada erga omnes que só é possível porque a lei delineia um direito real a um vínculo obrigacional. Por esse registro, autorizado pela lei, contraria-se o princípio da relatividade das convenções, segundo o qual só vincula as partes contratantes. O novo titular do domínio deve respeitar o prazo do contrato de locação, do qual não fez parte. No dizer de Antunes Varela (1977, v. 1:51), as obrigações gozam de eficácia real quando, sem perderem o caráter essencial de direitos a uma prestação, se transmitem, ou são oponíveis a terceiros, que adquiram direito sobre determinada coisa".
(Lei do inquilinato comentada: doutrina e prática. Lei nº 8.245, de 18-10-1991. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, págs. 70/71 - grifou-se.)”.  (Grifo em amarelo nosso).
Vale transcrever o caput do artigo 8° da Lei n° 8.245/91:
“Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.”
             Por outro lado, no mesmo acórdão, consta decisum sobre um caso semelhante, cuja questão discutida residia no fato de que o novo adquirente teve ciência, plena e inequívoca, acerca da cláusula de vigência do contrato de locação, restando provado por documentos apresentados no processo que o mesmo concordava em manter a locação em andamento. Eis o texto que ora se reproduz (in verbis):
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DESPEJO. DENÚNCIA VAZIA. COMPRA E VENDA. MANUTENÇÃO CONTRATO DE LOCAÇÃO. AUSÊNCIA DE AVERBAÇÃO NA MATRÍCULA DO IMÓVEL. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DO COMPRADOR. VALOR DA CAUSA. IMPUGNAÇÃO. FALTA DE INTERESSE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 7/STJ.
1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e precisa sobre a questão posta nos autos.
2. A ausência de decisão sobre os dispositivos legais supostamente violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. Incidência da Súmula 211/STJ.
3. Na hipótese, trata-se de ação de despejo proposta por comprador de imóvel em face de locatário. Discute-se a possibilidade do comprador de imóvel locado proceder à denúncia do contrato de locação ainda vigente, com fundamento na inexistência de averbação da referida avença na matrícula do respectivo imóvel.
4. O Tribunal de origem, após analisar a documentação apresentada pelas partes, que retratava toda a negociação de compra e venda do bem, até a lavratura da respectiva escritura, entendeu que, não obstante ausente a averbação do contrato na matrícula do imóvel, o adquirente tinha a obrigação de respeitar a locação até o seu termo final.
5. Afastada a possibilidade da recorrente denunciar o contrato de locação com base na ausência da sua averbação na matrícula do imóvel porque ela tinha inequívoco conhecimento da locação e concordara em respeitar seus termos em instrumentos firmados com o locador e proprietário anterior.
6. Ausência de interesse recursal no que tange à alegação de violação dos arts. 259, V; e 261 do CPC; e do art. 58, III, da Lei 8.245/91 porque o valor atribuído à causa, pela sentença, na ação declaratória, foi de doze locativos mensais.
7. É imprescindível, para que se possa aferir o trabalho desenvolvido pelo advogado e verificar-se a adequação ou não do percentual da verba honorária no caso em tela, que se proceda a exame de matéria de fato. Assim, incide, na espécie, a Súmula 7 desta Corte.
8. Negado provimento ao recurso especial."

“(REsp 1.269.476/SP, Rel. Ministra  NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA, julgado em 05/02/2013, DJe 19/02/2013 - grifou-se).”.

             Como visto, no caso acima transcrito, apesar de não ter sido averbado o contrato de locação no Registro de imóveis, foi avaliado e considerado pelo magistrado que a ciência do comprador era inequívoca, contudo, ressalta o Relator que a obrigação de respeitar o contrato de locação, no caso, advinha de uma convenção entre as partes – comprador e vendedor (locador). Não se tratando propriamente de afastar a necessidade do registro, ou mesmo de ciência inequívoca da cláusula de respeito, pelo que  o relator ainda cita a doutrina de Sylvio Capanema de Souza (in verbis):
"(...)

    Ora, se o adquirente toma inequívoca ciência do contrato, que está vigendo por prazo determinado, e, na própria escritura de compra e venda, dela se fazendo ainda constar a obrigação de respeitá-lo, até o termo final, não vemos como poderá ele denunciar a locação, a não ser após expirar-se o prazo.

     Se, entretanto, não constar da escritura que o adquirente aceita o contrato, prevalecerá a primeira solução (possibilidade de denúncia – acréscimo nosso)". (Da locação do imóvel urbano: direito e processo. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2002, pág. 86 - grifou-se).”.

               Assim, o acórdão ora comentado é bastante interessante porque nos traz detalhes que ilustram bem situações cotidianas, envolvendo locação, compra e venda de imóveis não residenciais.
              Concluindo, parece óbvio, mas, diante do exposto, é mandatório o especial cuidado com os detalhes e a forma de redigir determinadas cláusulas ou pactos, bem como observar as condições legais previstas  para a validade de determinados atos, tanto na fase de negociação quanto na fase do seu sacramento, sendo imprescindível a análise sobre as possíveis controvérsias que podem se originar dos contratos, assim, podemos  evitar possíveis “dores de cabeça” e prejuízos financeiros.
             Bom feriado, boa sorte e fique na paz!!! J

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